quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O Quarto do Pânico

Diretor de rara competência tanto no cinema de mercado como em sua vertente cerebral, David Fincher parece aperfeiçoar sua técnica a cada nova incursão cinematográfica.

Clube da Luta (Fight Club) já demonstrava essa qualidade com tomadas surreais, como a da cena inicial que percorre o interior do corpo do perturbado Narrador (Edward Norton). Ou nas passagens onde os personagens lutam sob uma perspectiva lenta marcada por sons abafados que dão o tom de selvageria e ceticismo do homem pós-moderno que, na verdade, lutava contra o seu próprio “eu”, passivo e desajustado, buscando pontos de referência após o estabelecimento da chamada era do individualismo.

“O Quarto do Pânico”, decididamente, deixa indagações sociológicas em segundo plano. Trata-se de mero exemplar de produto corriqueiro embalado para retratar uma situação possível. No caso, duas mulheres são surpreendidas no meio da noite por assaltantes.

Em contra-partida a essa nítida falta de conteúdo, no quesito técnica o thriller pode ser considerado o reflexo da evolução de Fincher. A angulação pertinente e, quase, psicodélica termina assumindo o posto do próprio narrador em off onipresente e servindo de fio condutor aos olhos atentos de um espectador ávido por soluções.

A premissa apóia-se num roteiro lacônico que nas mãos de outro cineasta poderia ser um retumbante fracasso, pois há pouco o que explorar. Jodie Foster é Meg Altman, recém-separada do marido ela procura, juntamente com sua filha Sarah (Kristen Stewart), uma nova residência para recomeçar a vida. Sua busca termina numa mansão fantástica que possui um intrincado sistema de defesa: um cômodo impossível de ser invadido, em caso de roubos, ou o que venha a acontecer, e equipado com paredes de concreto, linha telefônica e ventilação independente, além de um sistema de monitores que cobre toda a casa e um detector de movimento.

Uma verdadeira fortaleza. Mas o que seria de tudo isso se não fosse possível testá-la logo na primeira noite das duas no casarão?É para isso que, afinal, serve um bom suspense e o mote é simples pretexto para fazer a máquina funcionar.

Um trio de assaltantes (entre eles, Jared Leto e Forrest Whitaker) surge na intenção de roubar uma fortuna que jaz escondida, justamente, no tal Quarto do Pânico lugar onde, obviamente, Meg e Sarah se refugiam para se esconder do iminente perigo. O que domina a cena, a partir de agora, é a tensão e o medo do que pode vir a acontecer após esse conflito.

A trama banal faz referência explícita ao estilo “Hitchcock” de se construir intrigas de eficiência singular amparadas no desenrolar do cotidiano. “Os Pássaros” concretizava a fúria da natureza a partir da visita de uma mulher a uma cidade litorânea; “Janela Indiscreta” tratava da imobilização de James Stewart, seu voyeurismo e vizinhos estranhos; e “Vertigo – Um Corpo que Cai” lidava com a vertigem de um homem e sua paixão obsessiva por uma mulher; Em comum, essas e outras obras do mestre do suspense, começavam sem fazer muito alarde. Pitadas de ironia antecipavam o que viria a acontecer e a tensão e o clima de mistério, logo, seriam constantes.


Fincher utiliza a cartilha a sua maneira. O início é nítida preparação com a apresentação do quarto e sua capacidade de abrigar desesperados. A claustrofobia de Meg é também outro problema apontado e, posteriormente, explorado, não tanto quanto o fato da filha diabética ter que controlar o medo para não entrar em coma. Os larápios é que variam entre o risco, propriamente dito, e um empecilho notado por questões burocráticas do roteiro. No final das contas, não haveria aflição sem a presença deles.

Mas o que angustia mesmo é todo o clima criado para esse enfrentamento, não a ameaça em si. O Quarto do Pânico termina sendo um produto de entretenimento eficiente por causa de direção, trilha sonora e atuações convincentes. Tudo azeitado com relevante cuidado para obstruir a tranqüilidade de qualquer um.

O som amplificado de Howard Shore comunga com a prática do diretor de Se7en fazendo um exercício potencial de claustrofobia e medo do inevitável. Em determinadas cenas, a impressão é que o aceleramento cardíaco é tamanho que não será possível resistir até o final da película. A atuação convincente de Foster também permite que o público acabe se identificando com o seu drama. O desespero em seu olhar e sua respiração ofegante só contribuem para o crescente aperto no coração

Avaliação: 7,0

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